Liderança: o limite entre ser seguro e revelar a própria vulnerabilidade
Demonstrar limitações não pode ser confundido com falta de autocontrole ou de inteligência emocional, e gestores precisam ficar atentos à questão
ntigamente, não tínhamos líderes, tínhamos chefes, que eram pessoas implacáveis, não demonstravam sentimentos, se impunham pelo poder do cargo e da autoridade e, muitas vezes, geriam com base no medo e na coação. Hoje, não existe mais espaço para esse profissional, apesar de sabermos que algumas empresas ainda têm pessoas assim. Mas a grande maioria das organizações já sabe que uma liderança que inspira, motiva e engaja gera mais resultados e consegue trazer o melhor de cada um para o dia a dia do trabalho.
Agora temos mais consciência sobre a importância de os gestores se posicionarem ao lado dos liderados, mostrando o caminho e facilitando o percurso para que as pessoas cheguem lá. Começamos a entender, também, que a liderança precisa demonstrar sinais de humanidade por trás da nomenclatura de gestor. Estão em destaque os líderes mais empáticos, acessíveis e, muitas vezes, que se permitem demonstrar alguma vulnerabilidade. No entanto, a linha tênue do que é aceitável ou não nessa demonstração de vulnerabilidade é um grande desafio para as lideranças.
Como você se sentiria, por exemplo, se contasse ao seu gestor uma situação crítica pessoal e ele não demonstrasse que se importa? Provavelmente, a sua reação seria se fechar. E se o seu gestor demonstrasse desespero por algum assunto do dia a dia do trabalho, se desequilibrasse diante de alguma crise ou viesse a chorar na frente da equipe? Garanto que muitos não se sentiriam seguros de seguir as ideias e os comandos dessa pessoa. Mas a vulnerabilidade não pode ser confundida com falta de autocontrole ou de inteligência emocional.
Considerando a posição de um líder, a vulnerabilidade aceitável é muito mais sutil. Ela é encontrada na abertura para discutir uma ideia e, se fizer sentido, reavaliar ou até mesmo mudar um ponto de vista e acatar uma ideia alheia. É um posicionamento vulnerável totalmente aceitável assumir quando não se tem certeza de algum tema, porém sem deixar de passar a segurança do porque é recomendado tentar seguir em uma determinada direção, deixando claro para o time que pode ser que aquela estratégia precise mudar ao longo do caminho e está tudo bem. É assumir o risco de escolher uma direção sem ter todos os dados em mente.
É também uma vulnerabilidade quando o líder assume, em um determinado dia, que não está bem, que está doente ou que tem algum desafio pessoal para resolver. Assim, as pessoas poderão entender que, talvez, uma feição mais séria, menos alegria ou um pouco de irritabilidade não tem nada a ver com a equipe. Nenhum de nós — você, eu e quem está ao nosso redor — vive o dia a dia 100% livre de qualquer desconforto. Se o líder encobre que não está bem, mas muda de humor ou comportamento, as pessoas tendem a achar que é algo pessoal relacionado a elas.
É por isso que eu digo que a vulnerabilidade é um estado sutil principalmente na vida de quem ocupa posições de liderança. É demonstrar que por trás do cargo e do crachá existe um ser humano que passa por dias bons e dias ruins, que nem sempre tem as respostas ou as certezas necessárias, mas está ali para ajudar, para tornar a jornada da equipe mais fácil e menos solitária. A vulnerabilidade aceitável também é assumir erros e deixar claro que ninguém vai acertar 100% do tempo, mas que é melhor arriscar e, algumas vezes, errar do que ficar na inércia por medo de escolher um caminho, uma estratégia.
Liderança tem a ver com a equipe saber que o gestor que está ali se importa genuinamente com as pessoas, é ético(a) nas suas ações, tem sentimentos e, por tudo isso e mais, é capaz também de ter empatia pelo momento e sentimentos de seus liderados. Isso tende a criar um ambiente em que os membros da equipe sabem que podem ser honestos no dia a dia da organização sobre suas ideias, pensamentos e sentimentos, sem receios de serem julgados ou mal interpretados.
Para ser mais certeiros na construção desse ambiente de acolhimento, recomendo que os gestores fiquem atentos aos descompassos emocionais, aos sinais de desespero ou às mudanças muito bruscas de humor, em si mesmo e nos outros. A liderança precisa ser um porto seguro mesmo sem ter todas as certezas, tomar a decisão mesmo sem todas as evidências e engajar o time para que juntas as pessoas consigam se dirigir aos objetivos da organização à qual elas pertencem.
Faço esses alertas porque, como disse a escritora, pesquisadora norte-americana e autora do livro A Coragem de Ser Imperfeito, Brené Brown, “vulnerabilidade é a primeira coisa que eu olho em você e a última coisa que eu estou disposta a demonstrar”. Essa frase é uma boa reflexão para iniciar a mudança de uma postura. Afinal, a própria Brené Brown classifica a vulnerabilidade como sendo incerteza, risco e exposição emocional. Ela destaca que vulnerabilidade não é fraqueza, mas sim uma forma de mensurar a nossa coragem.
Além do livro da Brené Brown, também recomendo a leitura do artigo escrito por Dan Cable e publicado na Harvard Business School sobre como construir confiança demonstrando vulnerabilidade. O autor inicia o texto contando a história de um líder, Fabian, que sempre buscou ser “a pessoa mais inteligente da sala”, mas, com o tempo, passou a enfrentar dificuldades e percebeu que precisava mudar de postura.
Ao longo da reflexão, Dan Cable cita que líderes que tentam esconder suas limitações podem ter o sentimento da síndrome do impostor. Ele cita a importância de criar um ambiente no qual as pessoas tenham segurança psicológica para colocar novas ideias em prática e aprender. Fala, ainda, sobre humildade moral e ética, a importância do líder compartilhar situações nas quais aprendeu com o erro e colocar em prática sessões de feedbacks, tornando-se mais acessíveis e menos arrogantes.
Liderança inspiradora é muito do que um time precisa para se manter motivado a contribuir da melhor forma possível para os resultados da organização. Vale a pena investir nisso!