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Como se livrar dos feedbacks inúteis

No livro "Como Criar Relações Mais Profundas", professores de administração da Universidade de Stanford (EUA) explicam por que é importante tornar as conversas de carreira mais eficazes – e mostram como fazer isso.

Por Redação
Atualizado em 10 abr 2024, 09h15 - Publicado em 2 dez 2022, 07h35
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    a forma como acontecem nas empresas, muitas conversas de avaliação de desempenho se assemelham a um papo descompromissado entre amigos — ou desafetos, quando o gestor está insatisfeito com o funcionário e passa a acusá-lo, em vez de orientá-lo. E o liderado fica na defensiva, mesmo quando o líder lança mão de uma velha técnica: o feedback sanduíche, em que se faz um elogio, depois uma crítica, depois um elogio, na (vã) esperança de que o ouvinte saia com a sensação de que o saldo foi positivo. Mas o fato é que nada disso funciona, mostram David Bradford e Carole Robin, professores da pós-graduação em administração da Universidade Stanford, no livro Como Criar Relações Mais Profundas. As lições reunidas na obra, que revela como muitos dos dilemas profissionais são fruto de problemas de relacionamentos interpessoais, surgiram da experiência deles à frente do MBA mais popular da instituição.

    Trecho do livro

    Focar a própria realidade é mais complicado do que parece, já que existem três áreas diferentes de compreensão, ou realidades, quando duas pessoas interagem. A primeira realidade é a intenção, a segunda é o seu comportamento, e essa é a área que ambos acessam. Ela consiste nas palavras, no tom, nos gestos e nas expressões faciais. A terceira é o impacto do seu comportamento sobre o outro. E, no começo, cada pessoa só tem conhecimento de duas das três realidades. Quando explicamos esse modelo, pedimos aos alunos que imaginem uma rede de tênis entre a primeira e a segunda “realidade” — isto é, entre a intenção e o comportamento. No tênis, você não pode entrar no campo do oponente, e o mesmo vale para o feedback. Você precisa ficar no seu lado da quadra. Mas o que vemos, em geral, é que as pessoas não utilizam esse modelo de feedback. Elas não focam a própria realidade, mas atravessam a rede ao tirar conclusões sobre o outro. Elas dizem: “Você não quer ajudar”, “Você só quer vencer a briga!”, “Sinto que você só pensa em si mesmo” ou “Sinto que você não se importa”. Não é de admirar que muitos feedbacks causem mágoa e deixem as pessoas na defensiva, já que provavelmente fazem o outro se sentir incompreendido ou, pior, atacado.

    O feedback também dá errado quando a pessoa que o oferece acredita estar descrevendo o comportamento do outro (a segunda realidade), mas não faz isso de verdade. Um comportamento é algo que você pode indicar — palavras, gestos e até o silêncio são exemplos. Um teste útil é se questionar: se outra pessoa assistisse a um vídeo da interação, ela diria que viu os mesmos comportamentos? Por outro lado, dizer “Você só quer ganhar a briga” não é um comportamento que pode ser observado; é um julgamento feito com base em uma série de comportamentos. O que exatamente a pessoa fez para você chegar a essa conclusão? Ela interrompeu seus argumentos e falou por cima de você, menosprezou o valor das suas contribuições ou continuou insistindo nos próprios argumentos até você desistir?

    A dificuldade não está na rispidez ou na negatividade do feedback, mas no fato de ele não ser específico o suficiente para ser útil

    Muitas pessoas evitam oferecer feedbacks negativos por medo de causarem reações negativas e desmotivação. O problema é o termo “feedback negativo”. Nós dois detestamos essa expressão, porque acreditamos que todo feedback comportamental é positivo, mesmo quando se refere a um ato problemático. Comportamentos podem mudar, e o feedback é uma oportunidade para melhoria. Nós preferimos a palavra “afirmativo” para descrever feedbacks sobre comportamentos de que você gosta e que deseja citar como pontos fortes, e “evolucionário” para aqueles referentes a atitudes problemáticas.

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    Todo feedback é um dado. A informação pode transmitir algo sobre o emissor e também sobre o receptor (no geral, transmite sobre os dois). Porém, trata-se de dados, e, quanto mais dados, melhor. Em resumo, é preferível saber a ignorar.

    O feedback dado pouco depois de um evento tem um impacto maior porque o acontecimento ainda está fresco na mente de todos. Comentar um comportamento que ocorreu meses antes é bem menos útil, já que ele se tornou uma lembrança distante, talvez até distorcida.

    Cuidado com o “sanduíche de feedback”

    Com frequência, as pessoas usam o “sanduíche de feedback”, acreditando que isso tornará o feedback mais fácil de engolir. “Sanduíche de feedback” significa começar com algo positivo (para preparar o terreno), depois dizer algo negativo e concluir com algo positivo para a pessoa se sentir bem. “Joe, você fez um ótimo trabalho aqui, mas precisamos conversar sobre um problema. No entanto, você é um funcionário essencial.”

    O feedback é um presente. E, quando alguém lhe dá um presente, você não é obrigado a usá-lo

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    Infelizmente, essa abordagem quase nunca dá certo. Assim que você começa com o positivo, o outro já entra na defensiva, esperando pelo “mas”. Ele dispensa a boa notícia e não a absorve.

    O sanduíche de feedback costuma ser utilizado porque você tem medo de que o receptor se sinta completamente rejeitado se não escutar um reforço positivo. Porém, isso cria confusão na hora de explicar o problema. A dificuldade não está na rispidez ou na negatividade do feedback, mas no fato de ele não ser específico o suficiente para ser útil. Isso também contamina o feedback afirmativo, porque ele passa a ser visto como uma tática — algo oferecido não como uma oportunidade de aprendizado, mas com o intuito de manipular.

    A invenção de histórias

    É nítida nossa tendência a elaborar histórias sobre os motivos para alguém se comportar de determinada forma. Os seres humanos sentem uma necessidade enorme de dar sentido às suas experiências. Porém, quando se trata de feedback, poucas coisas causam tantos problemas quanto inventar histórias, especialmente se fazemos isso sem nos darmos conta. Quando você passa de um palpite para um forte pressentimento, e então para a certeza, cria uma história que acaba de vez com a curiosidade. Isso acontece independentemente de a história ser um exemplo clássico de atravessar a rede (“Ele sempre quer dar a última palavra”) ou uma junção de dados escolhidos a dedo para se encaixar em uma narrativa negativa (“Ele não me respeita; sempre fica olhando para o telefone quando tento conversar”). Nesse ponto, mesmo que você faça uma pergunta, provavelmente será uma pseudopergunta, como “O motivo para você sempre querer dar a última palavra não seria…?”, e isso não dá margem para um debate aberto. Quando inventamos uma história, é fácil fazer atribuições.

    Como lidar com mecanismos de defesa

    Quando a outra pessoa permanece no próprio lado da quadra, ela reage ao seu comportamento. Ela não julga seu caráter. Talvez você continue se sentindo um pouco atacado, mas não precisa encarar isso como uma rejeição total.

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    É preciso diferenciar estar na defensiva e precisar se defender. Se alguém faz uma acusação com a qual você não concorda, mostrar o erro seria estar na defensiva? Se alguém interpreta você do jeito errado, tentar justificar seu comportamento seria estar na defensiva? Se você for atacado, não é certo tentar se defender?

    O problema não é necessariamente ficar na defensiva, mas os efeitos colaterais disso. Essa postura pode bloquear sua capacidade de ouvir um feedback, ou você pode dispensá-lo no mesmo instante com explicações, mesmo que tenha prestado atenção. Quando acreditamos que o feedback é exagerado, o fato de estarmos na defensiva nos impede de analisar quais aspectos podem ser válidos. Acreditar que um feedback é completamente errado faz com que você bloqueie o desejo de entender por que a pessoa se sente daquela forma.

    Então como nós podemos nos defender sem essas consequências limitantes? Reconheça o sentimento e segure a vontade de rebater. Em vez disso, tente compreender o que o outro fala. Deixe de lado a necessidade de “ter razão”. A questão mais importante no momento é o feedback oferecido pelo outro — não defender sua identidade ou seu ego.

    Não importa se você está recebendo ou dando feedback: ficar na defensiva costuma ser um sinal de que existe alguma verdade nele e, portanto, existe algo a ser explorado ali. Quando alguém ataca você — mesmo que com rispidez — com algo que não faz sentido, qualquer mecanismo de defesa dura pouco. Porém, se você permanecer na defensiva, parte da acusação pode ter atingido um ponto fraco. Talvez seja algo que você não queira admitir ou que pareça exagerado, mas colou mesmo assim. Depois de reconhecer esse fato, você passa a ter algumas opções sobre como reagir. Você é capaz de identificar a parte que parece pelo menos parcialmente verdade? Se for, diminua sua resistência, preste mais atenção no feedback do outro e, talvez, aprenda um pouco.

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    Já dissemos várias vezes que o feedback é um presente — mas apenas porque, quando alguém lhe dá um presente, você não é obrigado a usá-lo. Talvez esse não seja o melhor momento para tomar uma atitude. Encarar o feedback como uma informação que agrega e aumenta suas opções — não como uma ordem de mudança — faz com que seja mais fácil ouvi-lo e levá-lo em consideração.

    COMO CRIAR RELAÇÕES MAIS PROFUNDAS

    Autores: David Bradford e Carole Robin
    Editora: Sextante
    Páginas: 288
    Preço: 54,90 reais

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