São Paulo – Eleito com 55% dos votos válidos no que foi considerado o período eleitoral mais conturbado da história brasileira desde a redemocratização, Jair Bolsonaro enfrentará inúmeros desafios a partir de janeiro de 2019.
Além de lidar com uma nação rachada ao meio, o novo presidente será pressionado a fazer ajuste fiscal, melhorar os índices de desemprego e aprovar reformas de impacto. Para ajudá-lo na missão, o futuro dono da cadeira mais importante do país escalou Paulo Guedes para assumir o Ministério da Economia, que reunirá as pastas da Fazenda, do Planejamento e da Indústria e Comércio.
Guedes já declarou ter três prioridades. A primeira, segundo ele, é a reforma da Previdência; a segunda, a redução das despesas com juros da dívida por meio de privatizações; e, a terceira, o enxugamento da máquina pública. O economista também sinalizou que vai rever a política comercial brasileira e que o Mercosul não será prioridade.
A dúvida de analistas, no entanto, é se haverá força política para aprovar esse novo modelo. Para eles, mesmo que o partido do novo presidente, o PSL, tenha a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados, com 52 parlamentares, atrás apenas do PT, que elegeu 56, será preciso dialogar com a oposição e negociar com diferentes setores da sociedade. E os indicadores atuais do país não ajudam.
Hoje, o desemprego afeta a vida de 12,5 milhões de pessoas, a expectativa de crescimento do produto interno bruto (PIB) é de 1,36%, os juros básicos continuam num patamar considerado alto, com a taxa Selic em 6,5%, e a inflação tem previsão de fechar 2018 em 4,43%.
Não à toa, os executivos das 150 Melhores Empresas para Trabalhar estão cautelosos. Eles aguardam, entre outras coisas, uma retomada da confiança da população. A volta do consumo, por exemplo, será essencial para impulsionar a produção e voltar a contratar.
“A chegada de um novo governo pode dar uma injeção de ânimo, mas isso não acontece num passe de mágica”, diz Otto Nogami, professor de economia no Insper. De acordo com o especialista, mesmo num cenário ideal, em que não haja complicações relevantes para ajustar as contas, um crescimento sustentável só deve ocorrer no prazo de dois anos, com melhora efetiva a partir de 2020.
Até lá, provavelmente, o mercado seguirá em compasso de espera. O cenário continua de investimentos reduzidos, contratações em marcha lenta e quadros menores. Segundo dados coletados do Guia de Melhores Empresas para Trabalhar, o índice de demissões (voluntárias e involuntárias) foi de 21,4% em 2017, número maior do que o registrado no ano anterior, de 20,1%.
Fernando Mantovani, diretor-geral da consultoria de recrutamento Robert Half, pontua que muitas organizações tiveram de desonerar a folha de pagamento e estão operando com menos empregados do que o necessário. De fato, as companhias promoveram um achatamento das linhas sucessórias, passando a ter um número menor de níveis hierárquicos, além de uma “juniorização” de funções menos estratégicas.
Ver profissionais jovens, com salários menores, assumindo o lugar de outros mais experientes tornou-se lugar-comum. “Nos últimos três anos, as empresas ativaram o modo de sobrevivência em busca da manutenção da rentabilidade e tiveram de redesenhar seus negócios. Mas, em dois anos, acredito que teremos um movimento de volta do crescimento, com novas contratações e valorização de equipes mais seniores”, diz Luiz Valente, CEO da consultoria de recrutamento Talenses Group.
Coteminas, Localiza, Alcoa, Brasal, Grupo Engefort, Rodobens e Eli Lilly são algumas das Melhores que tiveram, por diferentes razões, de reduzir seus quadros.
Notícias como o fechamento de turnos em fábricas, mudanças de endereço de escritórios, fusões e aquisições também ficaram mais comuns entre as Melhores. Um dos casos mais notórios é o da Dow, fabricante de produtos químicos, plásticos e agropecuários.
A multinacional americana se fundiu com a DuPont, outra gigante do setor, numa operação avaliada em 130 bilhões de dólares que está levando à criação de três empresas diferentes. Outro movimento emblemático foi a fusão global da Bayer com a Monsanto, que criou a maior companhia integrada de pesticidas e sementes do mundo.
Em ambas as situações, de acordo com os RHs, a comunicação foi a principal ferramenta para manter o engajamento das equipes.
Reforma trabalhista
Na busca por produtividade em tempos difíceis, as companhias ainda tentam compreender os efeitos da reforma trabalhista, aprovada em julho do ano passado. Consultores da área acreditam que haverá uma flexibilização cada vez maior dos modelos de trabalho, com o aumento da mão de obra terceirizada e intermitente.
A varejista Magazine Luiza já se vale das possibilidades da reforma. Com 920 lojas, a companhia tem 25 000 funcionários e mantém um banco de 4 500 empregados intermitentes, que são acionados com frequência para ajudar nos momentos de pico da operação. De acordo com a varejista, outros 3 000 serão contratados com modelos mais flexíveis até o fim deste ano.
Além disso, a partir de 2019, três mudanças devem ser implantadas de forma mais intensa: o oferecimento de prêmios financeiros, que agora podem ser concedidos até duas vezes ao ano, sem risco de ser considerado acréscimo de salário; o fracionamento das férias, que será cada vez mais diluída em etapas; e o trabalho remoto, com o pessoal realizando as tarefas num modelo misto entre casa e escritório.
“Isso é atraente do ponto de vista da qualidade de vida. Só é importante lembrar que o empregador fica desobrigado a pagar horas extras, por causa da falta de controle da jornada”, pontua Luiz Valente, da Talenses.
Vagas à vista
Apesar da breve euforia do mercado com a eleição de Jair Bolsonaro para presidente (um dia após o pleito, a cotação do dólar havia caído abaixo de 3,60 reais), as 150 Melhores estão com os pés no freio. Quando o assunto é contratação, apenas 66 dos executivos de recursos humanos consultados (o equivalente a 44% do total) pretendem abrir vagas no próximo ano.
Mesmo assim, a projeção de novos postos para 2019 é maior do que para 2018: estima-se a abertura de 47 071 vagas, alta de 9,4% ante o total previsto na última edição do Guia. Segundo Regina Helena Couto Silva, responsável por macroeconomia no banco Bradesco, o dado evidencia certo otimismo do mercado.
“Vivemos em crise há três anos e, pela primeira vez, existe uma ligeira esperança de um novo rumo”, avalia. A expectativa é que o PIB cresça 1,8% em 2019. Se houver redução de juros, controle da inflação e solução para os 12,5 milhões de desempregados, a economista acredita que haverá, enfim, uma recuperação.
Alguns setores já preveem maior aquecimento. O de serviços é um deles. Sozinho, esse segmento concentra 20% das chances de emprego entre as Melhores. Na Vivo, por exemplo, a previsão é contratar 11 500 pessoas, sobretudo para as áreas de call center, administrativo e lojas. “Adaptaremos o quadro para ampliar a eficiência e enfrentar os desafios do nosso negócio”, diz Niva Ribeiro, vice-presidente de pessoas da Vivo.
O setor bancário também apresenta oportunidades. Juntos, os bancos classificados neste Guia projetam abrir 6 500 vagas. Só o Bradesco, que aposta num crescimento de pessoal, será responsável pela geração de 5 500 postos, em todos os níveis hierárquicos.
A movimentação no quarto maior banco de varejo do país, aliás, tem sido intensa. No primeiro semestre de 2018 foram 18 000 promoções e transferências em todo o país.
O banco digital Agibank, com sede em Porto Alegre (RS), espera realizar 1 000 contratações. Haverá posições nas áreas comercial, de tecnologia e de negócios, além de possibilidades de atuar na filial dos Estados Unidos.
“Independentemente do cenário político-econômico, nosso planejamento é manter a estratégia de expansão, inclusive internacional. Para isso, trabalhamos na otimização de custos fixos e investimos em tecnologia”, diz Jeane Campelo, responsável pela gestão de pessoas do Agibank.
A área de tecnologia é outro destaque. Analistas de mercado acreditam que empresas que comercializam hardware e software terão de ampliar os setores de atendimento e desenvolvimento de produtos devido à crescente demanda do mercado.
A SAP Labs Latin America, por exemplo, prospecta 225 vagas para 2019; enquanto a Locaweb, 340. Já a Teleperformance, empresa francesa de tecnologia especializada em relacionamento multicanal com o cliente, pretende abrir 10 800 postos ao longo do ano que vem.
Segundo Simone Nunes, diretora de Capital Humano da Teleperformance, serão 2 400 novas contratações e o restante direcionado para reposição do turnover. A maior parte das posições é para agentes de atendimento.
“São especialistas em relacionamento entre marcas e consumidores, que fazem interação por diferentes canais de atendimento, como chat, e-mail, voz e rede sociais”, diz a executiva.
De acordo com a previsão de consultores, os setores do agronegócio e farmacêutico também serão promissores para quem busca emprego. Na farmacêutica francesa Sanofi haverá 1 000 vagas em 2019, principalmente para estagiários, operadores e analistas.
“O que valorizamos em nossos funcionários é a atitude positiva em relação à mudança e a capacidade de atuar de forma colaborativa entre as áreas”, diz Pedro Pittella, diretor de recursos humanos da Sanofi Brasil.
A Suzano Papel e Celulose, maior produtora global de celulose de eucalipto, também tem boas perspectivas. A companhia está envolvida em um processo de fusão com a Fibria, outra gigante do segmento. A operação, que ainda está sujeita à aprovação de órgãos reguladores, deverá criar 1 100 posições.
“O foco principal dessas vagas serão os projetos de novos negócios tanto nas unidades fabris quanto em nossas operações de plantio e florestais”, diz Rosely Poletti, gerente executiva de gente e gestão da Suzano Papel e Celulose.
Após seguidos anos de dificuldade econômica e enxugamento de quadros, o varejo também espera uma retomada nas contratações. Empresas como a Gazin, com previsão de 2 220 vagas, e Magazine Luiza, que ainda está fechando o planejamento, mas estuda algo em torno de 10 000 oportunidades entre efetivos, temporários e intermitentes, devem ajudar a reaquecer o segmento.
O mesmo deve acontecer com a construção civil, no qual espera-se uma guinada por causa da chegada de novos governos, que devem iniciar obras e retomar projetos paralisados em áreas-chave, como infraestrutura, saúde, educação e segurança pública.
Nesse cenário, quem tiver visão de negócios e for capaz de antecipar movimentos e tendências sairá na frente, identificando oportunidades. Capacidade de assumir riscos, olhar estratégico, foco em resultados, resiliência e poder de inovação também farão diferença.
“Essas habilidades ajudarão o profissional a enfrentar as situações desafiadoras que o momento impõe”, diz Irene Azevedo, diretora de transição de carreira e gestão da mudança da consultoria Lee Hecht Harrison.
Para a especialista, outra competência fundamental em 2019 será a capacidade de contextualização. “Não adianta ser o destaque da área se não integrar os conhecimentos com outros setores. As companhias esperam do profissional o poder de encaixar informações”, afirma.
Por fim, deve-se pesquisar sobre a organização e analisar se combina com os planos de carreira. No Guia da revista VOCÊ S/A, há informações sobre as 150 Melhores Empresas para Trabalhar do país. Quem sabe seu próximo emprego não está aí?