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Como implementar o foco profundo nas empresas?

O conceito estimula a capacidade de se concentrar sem distrações, ajuda a diminuir a ansiedade e a aumentar a inovação

Por Caroline Marino
Atualizado em 19 nov 2021, 09h19 - Publicado em 15 out 2021, 07h00
Imagem mostra Roberta, vestida de verde em um fudo neutro, olhando para a câmera.
Roberta Valezio, gerente de engajamento e experiência da Neon: técnicas de concentração e meditação ajudaram a melhorar o sono e a interação com a equipe (Celso Doni/VOCÊ RH)
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Este texto faz parte da edição 76 da VOCÊ RH

Conseguir manter o foco é algo raro hoje em dia. Em um mundo hiperconectado, no qual as informações chegam de todos os lugares — e-mail, telefone, WhatsApp, aplicativos corporativos de mensagens —, e tendo que conciliar diversos papéis durante o trabalho, dedicar-se a uma atividade sem interrupção tem sido difícil para muitos. Isso sem falar nas preocupações com a saúde, com a crise econômica e com a família, que se intensificaram com a pandemia de covid-19. Quando menos esperamos, em meio à produção de um relatório importante, lá vem mais distração — seja com uma notícia que chega sem aviso, seja com as mensagens que não param de aparecer.

Um estudo feito pela professora Gloria Mark, do departamento de informática da Universidade da Califórnia Irvine (UCI), mostra que as pessoas trocam de atividade, em média, a cada três minutos. Segundo ela, isso torna impossível o trabalho profundo, ou seja, a concentração em uma tarefa. Gloria exemplifica com a elaboração de um artigo. Para escrever algo com mais complexidade, uma pessoa leva em torno de uma hora para começar a pensar com criatividade. Assim, se mudar de tarefa a cada dez minutos, por exemplo, não será capaz de pensar com a concentração que a atividade exige. Isso porque trocar completamente o tipo de pensamento e voltar à atividade principal é mais difícil quando pulamos de uma obrigação para outra sem parar.

Sobrecarga cognitiva

Para melhorar o foco, é possível usar uma técnica interessante: o deep work, ou foco profundo, conceito cunhado por Cal Newport, professor na Universidade de Georgetown e autor de Trabalho Focado: Como Ter Sucesso em um Mundo Distraído (Alta Books, 63 reais). Ele define o deep work como a capacidade de se concentrar, sem distrações, em uma tarefa que exige muito poder cognitivo. Segundo o autor, é uma habilidade que permite dominar mais rapidamente informações complicadas e produzir melhores resultados em menos tempo. Cal explica em seu livro que a maioria de nós perdeu a capacidade de se aprofundar e passa os dias numa corrida frenética de escrever e-mails, checar as redes sociais e apagar incêndios. Esse comportamento impacta a inovação e a produtividade. “O problema é que isso está virando normal. Vejo pessoas participando de um treinamento, por exemplo, ao mesmo tempo que respondem a e-mails e interagem em uma reunião virtual. O cérebro não foi feito para se repartir em tantos focos de atenção”, afirma a psicanalista Claudia Cavallini, consultora e professora na HSM Educação Executiva. Segundo ela, isso acontece, na maior parte das vezes, em consequência das equipes reduzidas e do medo de perder o emprego. A sensação de muitos é que é preciso dar conta.

“Há tanta pressão, hoje, para as pessoas acompanharem o ritmo das mudanças, que há uma sobrecarga cognitiva — o oposto do deep work”, diz Caroline Marcon, fundadora da Marcon Leadership Consulting e sócia da Field Top Teams Consulting, consultorias de desenvolvimento de times executivos. Para ela, o foco profundo é uma das habilidades mais raras hoje em dia — e uma das mais valorizadas e importantes. “Quem conseguir entrar nesse estágio irá se diferenciar e ter insights inovadores. Isso porque, para inovar, precisamos refletir e descansar. Ou seja, dar tempo para a mente se recuperar e, assim, ter mais ideias”, afirma Caroline.

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Foco se cria

A boa notícia é que é possível desenvolver foco, como explica o educador Eduardo Valladares, designer de experiência de aprendizagem. “Foco não é uma habilidade inata. Foco se cria e pode ser desenvolvido a cada dia”, diz. Segundo ele, a grande dificuldade do trabalho focado é que as pessoas não depositam a atenção necessária em cada atividade por causa das distrações vindas da tecnologia, da sobrecarga de trabalho e das muitas demandas de que precisam dar conta. “É preciso um exercício diário, sempre realizando uma coisa de cada vez”, diz. Para isso, o planejamento é essencial. Algumas perguntas podem ajudar nesse sentido: quais são as demandas da semana? O que é prioridade? Quais imprevistos podem acontecer? “A separação do tempo, o planejamento e a priorização são cruciais para o trabalho focado”, afirma Eduardo. É importante também cogitar os imprevistos, como não ter sinal de internet ou enfrentar algum problema pessoal que não possa esperar. “Pensar num plano B ajuda a não perder a concentração”, afirma.

Roberta Valezio, gerente de engajamento e experiência da Neon, é um exemplo de profissional que aprendeu a ter foco. Ela encontrou no deep work uma alternativa para sua vida agitada e seu perfil multitarefas. “Sempre fui uma criança agitada. Fazia violão, natação, cantava na igreja. Quando entrei no mercado de trabalho, essa característica me acompanhou”, diz. Mas, segundo Roberta, a rotina ficou insustentável, com efeitos em seu corpo, como perda do sono, irritabilidade e ansiedade. Ela lembra que dormia com um caderno ao lado da cama para fazer anotações de ideias e projetos que surgiam durante a noite. “Comecei a pensar em como tirar aquele caderno de lá. Cheguei à meditação e a conceitos como o deep work”, afirma. Entre as técnicas, ela utiliza a disciplina do sono, o planejamento, a meditação e a reserva do tempo. “Sempre olho para a semana antes de ela começar. Claro que há imprevistos, mas planejo meus dias no domingo, reservando tempo para os assuntos prioritários, por exemplo, e estabelecendo quais pratos eu não posso deixar cair.”

Outro ponto importante para a gerente é organizar os horários para as atividades que demandam mais e menos concentração. Roberta divide o tempo em blocos, pois como RH precisa interagir com várias áreas, é necessário saber como irá agir. “Reservo, por exemplo, duas horas ininterruptas para desenhar um projeto ou estudar o mercado, e períodos para checar os canais de comunicação.” Segundo ela, um ponto importante para essa rotina dar certo é fazer combinados com a equipe e com a família. “Os acordos são essenciais. Aviso ao meu time que em determinado período ficarei indisponível e, se algo urgente acontecer, peço para me ligarem”, diz.

Outro hábito de Roberta é dormir oito horas por noite. “Às 22 já me desconecto das redes sociais para, às 23, conseguir dormir com tranquilidade. Acordo às 7 revigorada e pronta para o meu dia. Voltei até a sonhar”, diz. Roberta lembra que, antes do deep work, vivia num ritmo desenfreado, de só apagar incêndios. “Hoje tenho muita clareza de quais são minhas prioridades e do que preciso entregar”, afirma. Segundo ela, além de ajudar na própria concentração, a prática se reflete na equipe e até nos indicadores de clima. “Você passa a liderar de maneira mais empática e respeitosa.”

Cultura, comunicação e liderança

Disseminar a importância do trabalho focado exige, muitas vezes, criar uma nova cultura e repensar, por exemplo, como a liderança se comporta no dia a dia. A gestão é baseada na confiança ou no tradicional formato de comando e controle? As pessoas têm liberdade de falar com os líderes? Como a empresa orienta — e cobra — os líderes sobre seus relacionamentos com as equipes? Para o foco profundo dar certo, é preciso, por exemplo, um balanço entre a comunicação síncrona, aquela que acontece em tempo real, e a assíncrona, cujas respostas podem ocorrer de forma intermitente. “Um líder que solicita a disponibilidade da equipe 24 horas por WhatsApp, por exemplo, e exige respostas em cinco minutos, nunca terá um funcionário focado”, diz Eduardo. A recomendação é o equilíbrio. Claro que reuniões são importantes e há assuntos urgentes, mas é necessário refletir sobre o que realmente precisa ser definido em um encontro e quais profissionais devem estar presentes. “Hoje, há uma marcação desenfreada de reuniões. Algumas pessoas nem precisavam estar na conversa, mas são chamadas”, diz Claudia.

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Na Alelo, o RH criou o Dia do Foco. Toda quarta-feira, a companhia incentiva e orienta os funcionários a não agendar reuniões para que possam se dedicar a atividades que exigem mais concentração, como a construção de materiais e projetos, ou a realização de treinamentos. O objetivo é ter um dia de trabalho sem interrupções. De acordo com Soraya Bahde, diretora de gente e transformação da Alelo, a ideia surgiu depois de uma pesquisa interna sobre melhorias na rotina de trabalho. “A maioria relatou o excesso de reuniões como um entrave para a produtividade”, diz. O levantamento colheu frases do tipo: “precisamos diminuir a quantidade de reuniões; somos tomados 100% do dia por elas, e não sobra tempo para planejar e executar as atividades”; “há reuniões em excesso; tem dias em que elas acontecem durante todo o expediente e só tenho o horário depois disso para, de fato, trabalhar”.

Para auxiliar o time a aproveitar bem o Dia do Foco, a empresa criou um manual de boas práticas, com dicas de como realizar um trabalho concentrado. Nele, há recomendações como comprometimento no dia e transparência na comunicação. Uma vez que convites de reuniões podem surgir, a recomendação é que, se não for algo urgente, a data seja renegociada. Além disso, o manual tem dicas para otimizar o tempo, que incluem planejar as atividades e separar um período para responder e-mails e olhar os canais de comunicação. O documento também aborda a importância dos combinados com o líder sobre os momentos em que estará ausente e estimula pausas entre uma tarefa e outra. “Os resultados têm sido ótimos. Nas reuniões mensais sempre surgem comentários sobre os benefícios da prática, e alguns colegas de RH já me procuraram para implementar algo do tipo nas empresas em que trabalham”, afima Soraya.

Remoto X presencial

Os níveis de distração podem ser diferentes no home office e no escritório. Mas isso depende do ambiente que o trabalhador tem em casa e se ele divide o espaço com a família ou com os amigos. Pais e mães podem ter mais dificuldade de concentração no trabalho remoto, pois geralmente têm mais interrupções.

Por isso é tão importante o papel do líder, que deve conhecer sua equipe e investir em conversas individuais para entender o contexto de cada um. Nesse sentido, a empresa pode fornecer dicas para ter um home office mais focado, como reservar um espaço para o trabalho, fazer acordos com as outras pessoas da casa e manter a mesa arrumada. “Um local limpo e bem organizado ajuda muito na concentração. Olhar uma pilha de coisas em cima da mesa pode interferir no foco”, explica Caroline.

Apesar de a atenção em casa variar de acordo com o cenário individual, Caroline reforça que, nas empresas, é importante pensar em locais mais introspectivos para as atividades que exigem silêncio e concentração. “Ouvimos muito sobre espaços compartilhados e abertos para promover a integração, mas as companhias não podem esquecer de contar com áreas reservadas, como locais de reflexão e concentração”, afirma. Na visão de Claudia, é a hora de repensar os ambientes. “Precisam ser colaborativos, mas também respeitosos e voltados para combater o ruído”, diz

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