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Depressão no trabalho: como acolher quem enfrenta a doença

O Brasil é o país com o maior índice de depressão durante a pandemia. Entenda como as empresas devem ajudar quem adoeceu e se abrir para a saúde mental

Por Elisa Tozzi
Atualizado em 28 jun 2021, 18h47 - Publicado em 28 jun 2021, 07h00
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  • O Brasil é o segundo país com mais casos de depressão no mundo. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 5,4% da população sofre com o problema – ficando atrás apenas dos Estados Unidos. Mas esse dado foi divulgado em 2017, quando nem imaginávamos que a covid-19 iria assolar o planeta e trazer inseguranças que afetam enormemente o bem-estar mental. E os brasileiros estão particularmente suscetíveis a elas. Em uma pesquisa conduzida em 11 países, estudiosos da Universidade de São Paulo descobriram que os brasileiros foram os que mais desenvolveram quadros depressivos e ansiosos durante a pandemia. Não à toa, a OMS afirmou que a depressão é a doença do século 21 e que, até 2030, será a enfermidade mais comum do mundo.

    O impacto da depressão na vida de uma pessoa pode ser avassalador e afetar diretamente o trabalho. Isso porque quem está deprimido costuma ter mais dificuldades de se concentrar, de cumprir prazos e horários e de se motivar – mesmo para exercer atividades que, antes, eram prazerosas (conheça os sintomas da depressão no quadro abaixo). Além disso, há uma propensão maior a se sentir  estressado. “O deprimido sempre terá estresse”, diz Ana Maria Rossi, psicóloga e diretora da ISMA-Brasil (International Stress Management Association).

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    (VOCÊ RH/VOCÊ RH)

    O peso do preconceito

    Desde que a pandemia chegou e trouxe o medo da morte e do desemprego, as discussões sobre saúde mental estão se tornando mais recorrentes nas empresas. Tanto é que uma pesquisa feita pela Amcham Brasil com 199 líderes mostra que 49% deles estão muito preocupados com o equilíbrio psíquico dos funcionários. Mesmo assim, por ser uma discussão relativamente recente, profissionais com depressão ainda temem sofrer preconceitos e represálias. “Vários pacientes contam que não podem abrir o jogo no trabalho, então, eles tentam esconder. Alguns conseguem, mas sempre há perda de produtividade”, diz Jair Mari, psiquiatra e coordenador da pós-graduação do núcleo de psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

    O receito tem a ver com o estereótipo da depressão que, no imaginário de muitos, ainda é vista como algo que poderia ser evitado. “Existe um desconhecimento grande sobre saúde mental. Não se debate tanto o assunto quanto a saúde física”, diz Ana Maria. “Além disso, há preconceito contra os problemas mentais e isso é limitante. As pessoas gostariam de pedir ajuda, mas ficam inibidas e com medo de serem rotuladas de incompetentes, ainda mais nessa época em que empresas passam por enxugamentos.”

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    (VOCÊ RH/VOCÊ RH)
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    Não falar sobre o assunto traz riscos graves para os dois lados: empresas e profissionais. Do ponto de vista das organizações, as perdas aparecem em termos de produtividade e em custos com afastamento de pessoal, que cresceram durante a pandemia. Dados da Secretaria Especial de Previdência e Trabalho mostram que, em 2020, houve um aumento de 26% nos pedidos de afastamentos e aposentadorias por invalidez devido a transtornos mentais em comparação com 2019. “Os gestores precisam se conscientizar de que os custos com programas de saúde mental se pagam. Mas muitos não querem assumir esse compromisso no momento”, diz Ana Maria.

    Para quem adoece e não procura ajuda, a conta é ainda mais alta – e pode custar a vida. “Quanto mais tempo você fica deprimido, maior o risco de suicídio”, diz o psiquiatra Jair. E o número de pessoas que tiram a própria vida está crescendo no Brasil. Segundo o Atlas do Desenvolvimento Humano, houve um aumento de 15% na taxa de suicídios a cada 100.000 habitantes entre 2013 e 2017. Com a pandemia, é possível que esse índice siga em alta. “O ambiente de hoje possui vários fatores desfavoráveis. Estamos cercados de medo, de isolamento e de solidão. Isso privilegia a angústia. A pandemia pode influenciar e aumentar o número de suicídios, pois as pessoas ficam isoladas”, diz Jair.

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    (VOCÊ RH/VOCÊ RH)

    Suicídio sem tabu

    Foi depois de conversar com um colega psiquiatra que Marina Tavares, gerente do programa de saúde e bem-estar da GSK Brasil, e sua equipe ligaram o sinal de alerta para os riscos do suicídio. “Temos um psiquiatra no Chile com quem falamos muito e ele nos trouxe um dado assustador: após três a cinco anos do término da pandemia de covid-19, haverá uma segunda pandemia voltada para a saúde mental. E o suicídio será o pior resultado possível dessa nova pandemia”, diz Marina.

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    Pensando nisso, a farmacêutica britânica desenvolveu um programa específico para a prevenção do suicídio que já está em uso no Brasil, América Latina e Caribe. O lançamento aconteceu em setembro de 2020, aproveitando o Setembro Amarelo, mês de prevenção ao suicídio. Mas gestores e profissionais de recursos humanos e de saúde do trabalho foram sensibilizados antes do projeto estrear. “Nossa proposta é combater o tabu sobre o suicídio, pois o sofrimento psíquico nem sempre é visível. Queremos um ambiente mais aberto para questões de saúde mental para que a ideação suicida não seja uma possibilidade no futuro”, explica Marina. A campanha sobre suicídio foi tão bem-sucedida que, em junho deste ano, recebeu um prêmio da This Can Happen, instituição que apoia empresas a criarem um ambiente de trabalho psicologicamente saudável.

    Além de palestras sobre o tema, a GSK está recrutando voluntariamente funcionários de todos os cargos para atuar como socorristas de saúde mental – pessoas treinadas para acolher quem estiver passando por um momento de vulnerabilidade psicológica. Atualmente, o grupo conta com cerca de 60 voluntários ou Champions de Saúde Mental, como foram batizados.

    “É um treinamento internacional com cinco etapas. O objetivo é dar acolhimento, pois quem está com problema de saúde mental às vezes não consegue nem falar por estar em um nível de estresse muito alto”, diz Marina. “A proposta não é fazer terapia, nem dizer que ‘espera que o outro melhore’, mas trazer a pessoa para o presente e lembrar que há recursos na empresa que podem ser usados.”

    Os socorristas não seguem um protocolo fechado e avaliam a situação individualmente. Entre as ações estão, por exemplo, encaminhar o colega para o médico de trabalho, lembrar que há uma linha telefônica com atendimento de psicólogos à disposição e perguntar se a pessoa gostaria que o voluntário explicasse ao gestor ou ao RH o que está acontecendo. “Queremos criar uma cultura de saúde mental horizontal”, diz Marina.

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    A liderança precisa agir

    Segundo os especialistas, o acolhimento é mesmo essencial para que as empresas consigam ajudar quem está lidando com doenças psicológicas como a depressão. Nas companhias que não têm um programa tão estruturado quanto o da GSK, esse cuidado deveria estar entre as prioridades da liderança. Afinal, é a chefia que observa no dia a dia os comportamentos dos funcionários.

    “Como existe uma limitação por parte dos empregados para revelar o estado mental, cabe ao gestor dar essa abertura. É preciso agir com uma perspectiva não de cobrança, mas de interesse e empatia. Os profissionais têm que se sentir amparados, seguros e respeitados”, explica Ana Maria, da ISMA-Brasil.

    Para atuar dessa maneira, os líderes devem se lembrar de algo simples, mas que nem sempre está claro a todos os gestores: eles correm igualmente o risco de adoecer, como explica o psiquiatra Jair. “O presidente da empresa também pode sofrer e ter uma depressão importante. As pessoas são pessoas, independentemente do cargo ou da classe econômica.”

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