Meu pai não era muito de brincar com os filhos. Saía cedo para o trabalho, após tomar seu café e uma passada de olhos no jornal do dia. Voltava no comecinho da noite, exausto. Aos finais de semana, só queria descansar. Era quando podia, enfim, ler seu jornal inteirinho, e sem pressa. Comentávamos a coluna do Paulo Francis, e ele falava para mim, o filho mais velho, e para minha mãe, sobre o único assunto que tinha: o dia a dia no escritório.
Meu pai vivia para o trabalho. E não lhe parecia que isso estivesse errado. Pelo contrário. Trabalhar excessivamente, para a geração dele, dava uma impressão de sucesso. O velho trabalhava tanto que não tinha tempo para cuidar da própria saúde (estava sempre com a pressão alta, fumava compulsivamente…), ter uma alimentação equilibrada, cultivar amizades. Quando chamava algum conhecido em casa, coisa rara, era sempre alguém… do trabalho.
Não à toa, meu pai partiu cedo, aos 59 anos.
Sua história não foi tão diferente da de muita gente de sua geração, os baby boomers. Indivíduos criados com muita rigidez e disciplina, que valorizavam demais a conquista da estabilidade financeira e da realização por meio do trabalho.
Puxei muito ao meu pai, nos traços da face e nos gostos musicais. Mas, diferentemente dele, penso que o trabalho, em toda a sua importância, tem de estar em equilíbrio com nossa vida pessoal. Não faz sentido, pelo menos para mim, que esteja à frente das brincadeiras com as minhas filhas. Nem que me custe a saúde – e, em alguns momentos da minha carreira, já chegou a esse ponto. Não vejo como sinal de sucesso estar tão cansado, todos os dias, que não possa estar com amigos ou ir a um estádio de futebol, a um cinema.
As empresas que estão tentando se adaptar para uma semana de quatro dias “úteis” (como se os dias longe do batente fossem inúteis…) seguem o mesmo raciocínio. Ainda que os desafios sejam grandes – de mudança de mentalidade, principalmente, mas também de acertar os processos –, esses negócios pensam em conformidade com as novas gerações que estão chegando ao mercado.
Sabem como a oferta de mais vida pessoal está ligada à retenção de talentos. De profissionais mais criativos e saudáveis; menos estressados, menos cansados… Menos parecidos com meu pai e os trabalhadores de seu tempo.
Este texto faz parte da edição 92 (junho/julho) da VOCÊ RH. Clique aqui para conferir os outros conteúdos da revista impressa.