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Cotas em xeque: entenda a lei que quer mudar regras para os PCDs

Projeto de lei enviado ao Congresso Nacional questiona a obrigatoriedade de empresas com 100 ou mais funcionários contratarem profissionais com deficiência

Por Erica Martin
Atualizado em 15 dez 2020, 08h54 - Publicado em 15 Maio 2020, 06h00
 (Josh Appel/Unsplash)
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No fim do ano passado, o governo Bolsonaro enviou ao Congresso Nacional o Projeto de Lei no 6.159/19, que desobriga as empresas de contratar um percentual mínimo de empregados com deficiência. A contrapartida é que as companhias paguem dois salários mínimos por cargo não preenchido ao Programa de Habilitação e Reabilitação Física e Profissional, Prevenção e Redução de Acidentes de Trabalho, do Ministério da Economia. Se aprovado, o documento coloca em xeque a aplicação da Lei de Cotas, criada há 28 anos, que obriga organizações com 100 ou mais funcionários a manter em seu quadro de 2% a 5% de pes­soas com deficiência (PCDs) ou reabilitadas. 

A possível mudança tem dividido opiniões de especialistas, principalmente porque as PCDs já enfrentam diversas barreiras quando o assunto é a busca por um emprego. Dados da Secretaria do Trabalho, com base em informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apontam que só 1% dos 45 milhões de brasileiros com alguma defi­ciência estão no mercado formal.

Para Fabíola Cassel Ferri, advogada do Pipek Penteado Paes Manso Advogados, muitas organizações não conseguem cumprir a cota porque têm dificuldade de encontrar mão de obra e por atuarem em segmentos que impedem a contratação de profissionais com deficiência. O projeto proposto pelo governo, portanto, seria uma forma de minimizar esses problemas. “Há cargos que exigem plena capacidade física ou sensorial, como as atividades industriais pesadas. Nesses casos, a obrigação da lei se torna inexequível”, diz Fabíola.

Contrapontos

Mas há críticos do projeto. De acordo com Felipe Sampaio, professor de direito do trabalho do Cers, escola de cursos jurídicos, o adequado seria que as organizações fossem obrigadas a justificar o motivo pelo qual não conseguiram cumprir a cota. Só após a comprovação é que poderiam ter a opção do pagamento. “Seria uma obrigação alternativa. Da forma como o documento está hoje, a empresa pode substituir a contratação por um pagamento quando quiser. O projeto transforma uma previsão legal em algo meramente econômico.” 

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Cesar Souza, consultor de empresas e fundador do grupo Empreenda, acredita que, embora a proposta não seja boa, é preciso haver mudanças nas regras atuais. O especialista relembra o caso da Itaipu Binacional, que seria obrigada a destinar pelo menos 40% das vagas em concurso público a pessoas com deficiência ou reabilitadas.

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Porém, a 2a Turma do Tribunal Superior do Trabalho derrubou essa obrigação ao afirmar que a empresa não podia ser penalizada, porque buscara alternativas à cota, embora não tivesse conseguido. A geradora de energia tinha sido condenada a pagar multa de 10 000 reais por mês por vaga não preenchida. “A companhia precisou entrar na Justiça e arcar com uma série de custos para reverter essa situação, mas muitas empresas não teriam essa possibilidade. A aplicação da lei é ruim, por causa de uma atitude pouco flexível dos órgãos fiscalizadores”, diz Cesar.

O que também tem gerado polêmica é o fato de o projeto prever que um profissional com limitações consideradas graves (como é o caso dos tetraplégicos) seja contado duplamente. “É como se a pessoa com deficiência fosse um número, uma mercadoria quantificada. É desumano e fere a dignidade”, diz Maria Aparecida Gurgel, vice-presidente da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público de Defesa dos Direitos dos Idosos e Pessoas com Deficiência (Ampid) e subprocuradora-geral do Trabalho.

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Preocupação com a diversidade

Aparentemente, o projeto de lei facilita a vida das corporações — que podem deixar de se preocupar em trazer PCDs para seus quadros. Mas essa medida pode ser uma péssima estratégia. Isso porque as companhias que deixarem de contratar esses profissionais perderão, no médio e no longo prazo, o viés da inclusão — o que não é nada bom para os negócios.

“A diversidade é o que gera inovação dentro das empresas. Se você tem um grupo com pensamentos e realidades similares, sua empresa vai ter sempre as mesmas ideias e não evoluirá”, diz Alexandre Slivnik, especialista em recursos humanos e diretor da Associação Brasileira de Treinamento e Desenvolvimento (ABTD).

Mesmo com a aprovação da lei, a tendência é que as organizações que tenham políticas de inclusão mantenham a prática. “Essas empresas já entendem a necessidade de ter essa diversidade, de dar oportunidades a pessoas com pensamentos, culturas e contextos diferentes”, afirma Alexandre.


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