No ano passado, escrevi nesta coluna sobre a necessidade de investirmos nas profissões e capacidades do futuro. Questionei o fato de empresas e universidades não estarem efetivamente contribuindo para que os profissionais e estudantes comecem a desenvolver as competências e as habilidades que serão necessárias para enfrentar os desafios — ainda desconhecidos, é verdade — da próxima década. Muito se discute sobre esse tema, mas pouco se faz.
Quando falo sobre desenvolvimento de profissionais e estudantes, não me refiro apenas aos poucos privilegiados que têm acesso às melhores universidades do país ou do exterior e aos que conseguem trabalhar em multinacionais ou startups inovadoras. Falo da média, da base, do Brasil para o qual quase ninguém olha. Quantos desses indivíduos estão, de fato, sendo preparados para o mercado?
Os investimentos na formação continuam sendo focados em habilidades que atendem a demandas atuais, jogando para as próximas gerações a responsabilidade de se desenvolverem para a transformação gigante que está por vir.
Já vivemos as consequências mais graves da falta de investimento em pessoas dentro do ambiente empresarial: o desemprego e a informalidade. Milhões de pessoas estão nas ruas, muitas delas obsoletas por falta de oportunidade de desenvolvimento, não conseguem se recolocar na profissão e se rendem ao emprego informal — tentando se sustentar como motorista de aplicativo ou exercendo outros tipos de subemprego sem nenhum benefício, vínculo empregatício ou capacitação.
Uma pesquisa da consultoria ManpowerGroup, realizada em 2019 e divulgada recentemente no Fórum Econômico Mundial, mostra que 52% das empresas brasileiras, em especial as médias, têm dificuldade para preencher vagas. Esse índice é 18 pontos percentuais superior ao do ano anterior. Entre as carreiras com maior carência estão as profissões de ofício (eletricistas, soldadores e mecânicos); contabilidade e finanças; administração de escritório; vendas e marketing; e tecnologia da informação.
Não seria justo, obviamente, jogar nas costas das organizações privadas toda a responsabilidade sobre os problemas de educação e formação no país. Mas elas têm, sim, uma grande responsabilidade social a cumprir — em especial nos níveis operacionais e no chão de fábrica, onde o termo “autodesenvolvimento” nem sempre faz sentido. No fundo, se olhamos para a história do Brasil, esse fenômeno não é novidade: a média dos empresários sempre faz o que lhes interessa para a geração de resultados no curto prazo.
Cada instituição tem a obrigação de dar ferramentas para que seus profissionais possam se atualizar e se preparar para o futuro do trabalho, dentro ou fora de suas asas corporativas. As empresas precisam criar seus filhos para o mundo.