Vivemos o que os especialistas chamam de mundo Vuca, sigla para as palavras, em inglês, volátil, incerto, complexo e ambíguo. Corporações e pessoas são cada vez mais pressionadas por maior produtividade e menor custo, e são constantemente ameaçadas por novas concorrentes e tecnologias, que podem pôr fim a negócios e empregos que até então eram considerados estáveis. Nesse cenário, como preparar quem está entrando no mercado de trabalho? É esse o desafio que Tania Casado, professora da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), quer resolver no Escritório de Desenvolvimento de Carreiras, inaugurado em março. A seguir, Tania explica como funciona o projeto.
Por que o Escritório de Carreiras foi criado?
Baseamo-nos no conceito de que a carreira depende do indivíduo. Nessa linha, quanto mais autoconhecimento tiver, mais o jovem saberá o que é melhor para si. Fazemos essa reflexão pensando que as trilhas profissionais mudaram e a formação é só o ponto de partida. A gente precisa pensar em alternativas. O pessoal mais jovem terá desde já de começar sua trajetória sabendo se reinventar. Pensando nisso, eu dei a ideia para o pró-reitor de graduação, o professor Antônio Carlos Hernandes. Disse que era um absurdo a Universidade de São Paulo não ter uma área com tal propósito. Na USP, cada unidade tem sua seção de estágios, que faz a ponte entre as empresas e os alunos. Mas o Escritório é um espaço para a reflexão do jovem – sobre as suas potencialidades e as suas possibilidades de encaminhamento profissional.
Como funciona o Escritório?
Falamos no Escritório sobre o modelo conceitual de carreiras sem fronteiras, ou seja: pensar no caminho fora de qualquer restrição, sem fronteira de espaço, de tempo ou, inclusive, de formação. O modelo teórico que usamos para resolver essas carreiras sem fronteiras é a “carreira inteligente”. É uma concepção do teórico Michael Arthur, professor da Boston University e também coordenador do curso de carreiras pela Fundação Instituto de Administração (FIA-USP), baseada em três pilares. O primeiro seria o knowing-how, de saber como trabalhamos. Essa é a bagagem de conhecimento. A universidade fornece isso, mas o conhecimento sozinho não resolve. Vem então o segundo pilar, do knowing-why, por que trabalhamos. Aí entra o autoconhecimento: pensar sobre seus valores, motivações e o que é importante para você. Essa é uma das partes que o Escritório quer prover. O terceiro ponto seria o knowing-whom, que é sua rede de contatos: com quem você trabalha e com quem aprende. Para conseguir trafegar hoje pelo mercado, você precisa trabalhar esses três conceitos. E é isso o que o Escritório irá ensinar.
Como esses conceitos são repassados aos alunos?
Fazemos orientações individuais. Temos 31 alunos no Escritório, sendo 30 do último ano de graduação e um de pós-graduação da FEA, de cursos como administração, contabilidade, economia e até veterinária, química e engenharia. Eles são orientados por ex-alunos da FEA ou da FIA que atuam como voluntários e oferecem em média de seis a oito sessões de coaching. Também fazemos atividades coletivas nas Oficinas de Carreiras, que podem durar de quatro a oito horas. Eu supervisiono esses voluntários, que estão divididos em subgrupos: um prepara o material didático, outro cuida de palestras específicas, outro faz as oficinas, e outro grupo realiza o planejamento estratégico do Escritório.
Quem são os voluntários e como funciona seu trabalho?
São ex-alunos da FEA, que fizeram mestrado ou doutorado comigo na área de carreira, ou ex-alunos da FIA. Quando falei que iria abrir o Escritório, fiz um primeiro convite pedindo voluntários e 26 profissionais aceitaram. Eles trabalham de graça, mas ganham conhecimento e continuam seu processo de aprendizagem. Depois dessa primeira chamada, recebi solicitações espontâneas de gente que eu não conhecia. De todas as partes da universidade, comecei a ouvir colegas dizendo: “Nós temos um problema em comum, vamos nos ajudar”. Hoje, temos 30 voluntários.
Esse é o primeiro Escritório de Carreiras da América Latina?
No Sul, há uma iniciativa semelhante, antiga, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Mas somos os pioneiros por conta do alcance. Nosso público-alvo, os 60 000 alunos de graduação da USP. Na 1ª Oficina de Carreiras, que realizamos em abril, participaram 84 alunos, de 46 cursos diferentes. Inspiramo-nos em iniciativas que existem no exterior, especialmente em três: no escritório da Sloan School of Management, da Escola de Negócios do MIT; nos da Harvard, tanto dos cursos de direito, literatura e psicologia quanto dos de negócios, da Harvard Business School; e também no escritório da Universidade de Boston. Uma vez por ano, levo meus alunos para os Estados Unidos e visitamos essas universidades.