No começo eu era só certezas; no meio eu era só dúvidas; agora é o final e eu só duvido.” O poema de Mário Quintana ilustra bem o sentimento atual sobre o que acontecerá com a economia, a política, os negócios, os hábitos de consumo e os modelos de trabalho quando o coronavírus passar. Os números desta crise, a mais aguda desde que a Gripe Espanhola em 1918, a Grande Depressão em 1929 e as duas guerras mundiais assolaram o planeta, são alarmantes. Enquanto o renomado Imperial College London, instituição inglesa referência em modelagem estatística sobre a covid-19, aponta que a doença não está sob controle no Brasil (cada infectado aqui contamina mais de uma pessoa), o Fundo Monetário Internacional (FMI) prevê queda de 5,3% no PIB nacional em 2020.
A retração global não deve ser diferente: 3%, cenário pior do que o de 2008, quando a bolha imobiliária nos Estados Unidos estourou — o tombo mundial naquele ano foi de 0,1%. Além disso, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que 2,7 bilhões de trabalhadores já foram financeiramente afetados, sendo que mais de 25 milhões ainda podem perder o emprego em todo o mundo — segundo a agência da ONU, o quadro mais grave desde a Segunda Guerra Mundial.
Não sem razão, o indicador de incerteza da economia brasileira (IIE-Br), índice calculado pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas e termômetro de como anda a situação financeira de empresas e famílias, está nas alturas. Em abril, chegou ao mais alto nível desde 2000, alcançando 210,5 pontos. O recorde anterior havia sido de 136,8 pontos, em setembro de 2015, quando se aventava o impeachment de Dilma Rousseff (PT).
Para Anna Carolina Gouveia, economista responsável pela medição da FGV, esse indicador dificilmente baixará enquanto não houver uma resolução mais clara na saúde, como uma vacina, ou então a perspectiva de uma retomada comercial. “Quando a incerteza está elevada, os investimentos são praticamente nulos, desestabilizando todo o mercado”, diz a especialista.
E, se o avanço da tecnologia já vinha abalando as estruturas e provocando disrupções, a chegada de um vírus desconhecido só acentuou as ambiguidades. Neste momento, é prever como o capitalismo reagirá. “Os reflexos se perpetuarão por anos. As companhias não irão se recuperar da noite para o dia e terão de se adequar a uma realidade ainda desconhecida”, diz Yuri Trafane, consultor empresarial e representante no Brasil do instituto de pesquisas Gallup. “O resultado disso é uma falta de confiança na empresa, na liderança, no governo e no futuro do país.”
Na reportagem deste bimestre da VOCÊ RH, mostramos o que as empresas e as áreas de gestão de pessoas devem fazer para criar laços de confiança com os funcionários e liderar em um momento de tantas incertezas. A edição 69 já está nas bancas.
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