As empresas que estão atentas às tendências do mundo corporativo já reconhecem a importância das iniciativas de bem-estar. Elas percebem a mudança de comportamento no mercado de trabalho: hoje, 86% das pessoas trocariam seus empregos por outros, que lhes proporcionem mais satisfação e saúde mental. Mas será que as companhias estão considerando o bem-estar dos profissionais que estão na linha de frente da produção?
Para entender, precisamos refletir sobre como estamos abordando o tema do bem-estar atualmente.
Os profissionais da geração Z estão cada vez mais promovendo mudanças na relação com o trabalho: eles valorizam o equilíbrio entre as vidas pessoal e profissional, e expressam essa demanda nas redes sociais. No entanto, essa discussão geralmente está ligada a “cargos corporativos” (criativos, administrativos e financeiros).
Esses cargos estão em ambientes onde permanece a cultura hustle: um conjunto de hábitos prejudiciais (como horas extras) que estão relacionados à busca por alto desempenho a todo custo. É um cenário marcado pela cobrança por produtividade, que ocasiona sobrecarga mental e pode levar ao burnout.
E sabe qual é a principal demanda dos últimos anos no mundo corporativo? Flexibilidade. Abandonar o formato tradicional de expediente para que o colaborador seja mais produtivo de acordo com sua realidade, adaptando horários para fazer consultas médicas, por exemplo, ou buscar os filhos na creche. Essa prática vem de uma visão holística do bem-estar, que busca construir uma rotina saudável de trabalho em diversas dimensões.
Mas essas discussões sobre qualidade de vida ainda precisam incluir profissionais como operadores de máquinas, caminhoneiros, atendentes de caixa, faxineiros e pedreiros. Afinal, a sobrecarga, tão discutida no mundo corporativo, também se aplica a trabalhadores operacionais que recebem cobranças constantes, de chefes e clientes, por produtividade e agilidade.
Todos nós somos cobrados a fazer mais. Então, por que nem todos são contemplados nas discussões sobre bem-estar?
Inclusão é a palavra-chave
As lideranças não podem adotar o discurso da promoção de bem-estar sem antes garantir que os programas de benefícios estão atendendo às necessidades dos colaboradores em todos os níveis hierárquicos, até mesmo as de profissionais terceirizados.
E há um ponto de atenção, específico do contexto brasileiro. Por aqui, 78,5% das famílias afirmam estar endividadas, e as dificuldades financeiras são uma das principais causas de problemas psicológicos entre os trabalhadores. Não há como separar o bem-estar das condições econômicas: uma pessoa preocupada em pagar as contas dificilmente conseguirá reservar tempo e dinheiro para praticar exercícios físicos, se alimentar de maneira saudável, fazer terapia e se desenvolver profissionalmente. E vale ressaltar: pessoas superendividadas têm três vezes mais chance de desenvolverem problemas graves de saúde mental.
Os benefícios corporativos, então, podem mitigar esse problema. Para isso, devemos adaptá-los segundo as diferentes realidades dos colaboradores: uma mãe que precisa cuidar de seu recém-nascido; um profissional trans que faz um tratamento hormonal; uma pessoa que depende de medicamentos de uso contínuo; um pai de família que deseja estudar; mulheres que precisam de suplementos alimentares durante a menopausa…
Em suma: embora iniciativas para promover bem-estar estejam em alta, elas carecem de certa personalização pelas empresas. Por exemplo: para beneficiar quem trabalha no escritório, onde já se fala muito sobre benefícios corporativos, invista em uma transformação de cultura para reduzir a corrida pela produtividade. Para atender quem está na linha de frente, garanta que os benefícios estão suprindo as demandas que devem suprir. Aliás: garanta que os profissionais conheçam tais benefícios, divulgando-os em canais digitais, cartazes nos refeitórios, TVs corporativas e notas nos holerites. As lideranças também são porta-vozes fundamentais para garantir que todos estejam na mesma página sobre isso.
Investir em inclusão no ambiente de trabalho exige um esforço constante de todos para identificar e superar entraves em direção a uma jornada de cuidado. O bem-estar não é o mesmo para todos, mas precisa ser acessível.
*Luis González é CEO e cofundador da empresa de bem-estar corporativo Vidalink.